quinta-feira, abril 27, 2006

Abarco todo o horizonte


Chagrin d'Enfant (1898), Émile Friant

Abarco todo o horizonte.
Dentro de mim só há água,
água estagnada, dos charcos
represos da minha mágoa.

Tenho tudo nos meus olhos,
as cores todas,e ponho
um leve acento de angústia
nas margens tristes do sonho.

Dentro de mim só há sombra.
O que possa acontecer
vai rasgando espaços brancos
nas fronteiras do meu ser.



Como um eco


Écho (1936), József Egry

Não tinhas nome. Existias como um eco do silêncio. Eras talvez uma
pergunta do vento.

Albano Martins
(Assim São as Algas, Campo das Letras, 2000)

Análise da sombra



Analisa-se da sombra
seu caráter permanente:
pela manhã retraindo
a imagem, à tarde crescente.

E aquele instante em que a sombra
adelgaça o corpo fino
como se no chão entrasse
quando o sol se encontra a pino.

Quem a esse instante mira
em oposição ao lado
onde o sol era luz antes
logo vê o passo vago

da sombra que agora cresce
o corpo de onde se filtra
até fundir-se no limbo
que em torno dela gravita.

Forma esse limbo a coroa
que as sombras traz federadas:
soma de todas as sombras
num só nó à noite atadas.

César Leal